Um resíduo comum, muitas vezes descartado sem preocupação, pode se tornar a chave para um futuro mais sustentável. Cabelos humanos descartados em salões de beleza e barbearias estão no centro de uma pesquisa inovadora liderada por Gabriela Martines Gimenes, mestranda em Ciências Ambientais pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus de Toledo.
A iniciativa busca não apenas solucionar um problema ambiental, mas também integrar salões de beleza ao conceito de economia circular. “Meu maior anseio é transformar o setor em um modelo sustentável, promovendo mudanças no descarte e no reaproveitamento de seus resíduos. Esse seria um passo inovador e disruptivo”, afirma Gabriela, que atua como cabeleireira há 13 anos.
Composta principalmente por queratina, uma proteína rica em carbono, enxofre, oxigênio e nitrogênio, a estrutura do cabelo apresenta um grande potencial como fertilizante orgânico. Segundo os estudos conduzidos por Gabriela, em parceria com os professores Bruno Marcos Nunes Cosmo e Deysiane Lima Salvador, da Faculdade Unimeo, em Assis Chateaubriand, os resíduos capilares podem enriquecer o solo e melhorar a nutrição das plantas.
“O nitrogênio presente no cabelo é um dos principais nutrientes para o desenvolvimento agrícola. Ele estimula a atividade dos microrganismos no solo e pode reduzir a dependência de fertilizantes químicos”, explica Cleber Antônio Lindino, orientador do projeto e docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Unioeste.
Oportunidade de negócio
A pesquisa se encaixa perfeitamente no conceito de economia circular, que busca reaproveitar resíduos de uma atividade produtiva em outra. “Essa abordagem beneficia o meio ambiente ao evitar o descarte inadequado e diminuir o uso excessivo de fertilizantes químicos, que podem prejudicar ecossistemas quando aplicados em excesso. Além disso, ela cria novas possibilidades econômicas para o setor capilar e o agronegócio”, destaca Cleber.
Gabriela também ressalta o impacto positivo no mercado brasileiro, um dos maiores consumidores de produtos capilares no mundo: “Além de promover práticas ecológicas, essa tecnologia pode posicionar o Paraná como líder em soluções sustentáveis para o setor agrícola. É uma oportunidade de reduzir custos e, ao mesmo tempo, atender às demandas por práticas ambientalmente responsáveis.”
Atualmente, o Brasil é o quarto maior consumidor de fertilizantes no mundo, mas produz apenas 2% da demanda global. A utilização de resíduos capilares como fonte de nitrogênio pode reduzir significativamente essa dependência, oferecendo uma solução local para um problema nacional.
“Quando olhamos para a dependência do Brasil em importar fertilizantes, percebemos que o reaproveitamento de resíduos orgânicos, como os cabelos, não é apenas uma questão ambiental, mas também estratégica para a economia do país”, pontua Gabriela.
Com resultados preliminares promissores, a pesquisa sugere um modelo que pode ser escalado para beneficiar tanto salões de beleza quanto o agronegócio. Gabriela acredita que, com o apoio necessário, essa inovação pode transformar o Paraná em referência global em práticas sustentáveis.
“Na minha opinião, já é hora de o setor da beleza ser incluído na era da sustentabilidade. Temos aqui uma oportunidade única de alinhar duas indústrias fundamentais do Brasil — a beleza e o agronegócio — em prol de um futuro mais responsável e inovador”, finaliza a pesquisadora.
A continuidade desse projeto promete beneficiar salões de beleza, agricultores e o meio ambiente, mostrando que até mesmo um resíduo aparentemente simples pode ser um agente de transformação. A iniciativa não apenas resolve um problema local, mas também abre caminho para soluções globais em sustentabilidade