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Dia Mundial da Adoção levanta debate sobre entrega direta de crianças e insegurança jurídica no Brasil

Adoção por escolha da mãe biológica, sem vínculo de parentesco, ocorre com frequência no país, mas carece de previsão legal e consenso entre tribunais

Por: João Livi Fonte: UFPR
07/11/2025 às 09h34
Dia Mundial da Adoção levanta debate sobre entrega direta de crianças e insegurança jurídica no Brasil
Especialistas defendem que a regulamentação da entrega direta pode trazer segurança jurídica e proteção emocional às crianças envolvidas no processo de adoção. (Foto: Freepik)

No Dia Mundial da Adoção (9 de novembro), o tema ganha contornos de reflexão sobre um ponto ainda delicado e sem consenso jurídico no Brasil: a adoção por entrega direta, também conhecida como adoção dirigida. Apesar de não ter previsão legal, essa prática é recorrente e, em muitos casos, acaba recebendo aval judicial posteriormente.

Nessa modalidade, a mãe biológica escolhe diretamente a família adotante, mesmo sem laços de parentesco, e entrega o bebê fora do fluxo do Sistema Nacional de Adoção (SNA). O procedimento, embora comum, não encontra respaldo no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que determina que a escolha dos adotantes deve seguir a fila do judiciário, sempre considerando o melhor interesse da criança e do adolescente.

Adoções fora do sistema crescem e revelam brechas

De acordo com levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), analisado por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR), cerca de 800 casos de adoção por entrega direta foram registrados entre outubro de 2019 e maio de 2021 - um número expressivo diante da média anual de 4,5 mil adoções formais no país.

A pesquisa indica que, em parte dessas situações, o Judiciário acabou validando posteriormente as adoções realizadas fora do sistema, por entender que a criança já estava bem adaptada à nova família. No entanto, a ausência de regras claras cria um cenário de insegurança jurídica, tanto para as famílias quanto para as próprias crianças envolvidas.

Falta de regulamentação divide opiniões

O CNJ já se manifestou diversas vezes contra a regulamentação legal da entrega direta, alertando para o risco de fraudes e tráfico de crianças. A instituição defende que o processo de adoção deve permanecer restrito aos mecanismos oficiais, garantindo acompanhamento técnico e psicológico de todas as partes envolvidas.

Por outro lado, pesquisadores e juristas defendem que o reconhecimento jurídico da entrega direta, com parâmetros bem definidos, poderia garantir mais proteção e transparência. Essa é a tese apresentada pelo pesquisador Hermano Victor Faustino Câmara, no Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPR.

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Em seu estudo de doutorado, Câmara argumenta que o direito à entrega direta deveria ser previsto em lei, equilibrando o interesse da criança e o direito da mulher genitora de participar da decisão sobre o destino do filho. O pesquisador cita experiências de outros países, onde a mãe biológica pode escolher o nível de envolvimento no processo de adoção, sem que isso comprometa a segurança jurídica.

Entre o afeto e a legalidade

A discussão revela o desafio de equilibrar a dimensão emocional e humana da adoção com as exigências legais de proteção e transparência. Especialistas ressaltam que, embora o vínculo afetivo entre adotantes e adotados seja o coração do processo, a ausência de regras específicas abre espaço para arbitrariedades e vulnerabilidades.

Enquanto o país ainda busca um consenso, a data reforça a necessidade de olhar para cada caso de adoção com sensibilidade, respeito e amparo legal - princípios essenciais para que cada criança encontre, com segurança e afeto, o lar que merece.

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