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Decisão histórica sobre cota de gênero abre caminho para posse de Policial Fábio

Advogado João Gustavo Bersch detalha fundamentos da cassação da federação, explica a Súmula 73 do TSE e projeta próximos passos até a diplomação

Por: João Livi
13/11/2025 às 12h33
Decisão histórica sobre cota de gênero abre caminho para posse de Policial Fábio
Advogado João Gustavo Bersch explica a decisão do TRE-PR sobre fraude à cota de gênero que pode levar Policial Fábio à Câmara de Vereadores de Marechal Cândido Rondon.

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A batalha jurídica que pode levar o suplente Policial Fábio (PL) à Câmara de Vereadores de Marechal Cândido Rondon ganhou contornos históricos com a decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), que reconheceu fraude à cota de gênero em chapa ligada à Federação Brasil da Esperança.

Em entrevista, o advogado João Gustavo Bersch, especialista em direito eleitoral e responsável pela defesa do Partido Liberal, explicou que o caso gira em torno da Súmula 73 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que define os critérios para caracterizar fraude à cota de gênero:

  • Votação inexpressiva;

  • Movimentação financeira inexistente ou padronizada;

  • Inexistência de atos efetivos de campanha.

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Segundo o advogado, não é preciso que os três requisitos estejam presentes ao mesmo tempo. “Basta que um deles esteja configurado para caracterizar a fraude”, resumiu. No caso concreto, tanto o juízo de primeira instância quanto o TRE-PR entenderam que, em relação à candidata Franciele, não houve comprovação de atos efetivos de campanha.

Federação, PT, PV e o centro da controvérsia

Bersch destacou que a controvérsia não está apenas no cumprimento numérico da cota, mas no uso do mecanismo das federações partidárias, novidade no cenário político municipal em 2024.

Ele lembra que, isoladamente, o PT teria atendido à exigência legal. No entanto, ao integrar a Federação Brasil da Esperança, ao lado do PV e do PCdoB, o cumprimento da cota passou a ser analisado também partido a partido dentro da federação.

No caso do PV, foram lançadas três candidaturas masculinas e duas femininas. Duas das candidatas levantaram dúvidas, e a Justiça Eleitoral acabou reconhecendo que uma delas - justamente Franciele - foi usada apenas para preencher formalmente a cota, sem campanha real.

Já outra candidata, Ângela, também questionada no processo, foi mantida como candidatura válida, porque o Tribunal entendeu que ela realizou atos efetivos de campanha. Assim, o foco do reconhecimento da fraude se concentrou em Franciele, ligada ao PV.

Prova difícil, julgamento dividido e decisão marcante

O advogado classificou esse tipo de ação como um dos mais complexos em matéria eleitoral, porque envolve o que chama de “prova negativa”: demonstrar que alguém não fez campanha.

Segundo Bersch, o convencimento do TRE-PR se deu pela conjugação de provas: documentos, audiência de instrução com testemunhas e análise das postagens em redes sociais. Parte do material apresentado pela federação foi interpretada como postagens padronizadas, “de cumprimento de tabela”, sem a espontaneidade e o engajamento esperados de uma campanha real. Esse entendimento foi reforçado por uma ata notarial, que registrou a forma como tais conteúdos eram divulgados.

O julgamento no TRE-PR se estendeu por cinco sessões, ao longo de cerca de três semanas, com placar apertado de 4 votos a 3 pela manutenção da cassação. Para o advogado, trata-se de uma decisão de forte repercussão, marcada tanto pela natureza do tema - fraude à cota de gênero - quanto pelo fato de ser, segundo ele, a primeira decisão desse tipo envolvendo Marechal Cândido Rondon.

Embargos, TSE e expectativa de posse

A decisão colegiada do TRE-PR ainda não foi publicada em Diário Oficial, o que impede o início imediato dos prazos recursais. Bersch explicou que a federação ainda pode apresentar embargos de declaração, recurso usado para esclarecer pontos do acórdão, mas que, em regra, não altera o mérito da decisão.

Em tese, também é possível recorrer ao TSE, mas, nesse estágio, a discussão se limita a questões de direito, sem reexame das provas já apreciadas pelas instâncias anteriores.

Mesmo reconhecendo a possibilidade de novos recursos, o advogado afirmou que, pela forma como o voto da relatora foi construído e pela convergência entre a sentença de primeiro grau e o acórdão do TRE-PR, a expectativa é de manutenção do entendimento.

Sobre prazos, Bersch projeta, de forma estimativa, que a posse do Policial Fábio possa ocorrer em algo entre 20 e 30 dias, após a conclusão da fase recursal no TRE-PR e o cumprimento dos trâmites de diplomação.

Cota de gênero, mulheres na política e alerta aos partidos

Na entrevista, o advogado aproveitou para explicar a cota de gênero em termos práticos. A legislação exige que no mínimo 30% das candidaturas em cada chapa sejam destinadas a um dos gêneros (masculino ou feminino). Quando a conta não chega aos 30%, o número deve ser arredondado para cima, com inclusão de mais candidaturas.

O problema, enfatiza Bersch, é quando essa exigência vira apenas um número no papel. A Súmula 73 e a jurisprudência mais recente caminham no sentido de exigir candidaturas reais, com campanha, presença nas ruas ou atuação expressiva nas redes sociais.

Ele lembrou que Marechal Cândido Rondon tinha um histórico negativo na participação feminina: de 1960 a 2020, apenas duas mulheres haviam sido eleitas vereadoras. Em 2024, esse número já foi igualado, algo que o advogado considera um avanço importante, reforçado por ações de conscientização, como um evento realizado em 2023 com o tema “Por que não se elege mulher?”.

Bersch também citou um caso em que defendeu uma candidata de outro município que teve apenas um voto  - nem ela votou em si própria - e, mesmo assim, não houve cassação, porque a defesa conseguiu provar, com testemunhas, que ela esteve em campanha ativa nas ruas. Para ele, a questão central não é o número de votos, mas a prova de que a candidatura foi séria e efetivamente levada ao eleitorado

Disputa jurídica, não pessoal

Ao comentar a atuação da defesa, Bersch ressaltou que o trabalho é técnico e profissional, contratado pelo Partido Liberal para buscar o direito que entende caber à sigla e ao seu candidato suplente. Ele lembrou que a própria Federação Brasil da Esperança maneja ações semelhantes em outros municípios e que essa dinâmica faz parte do “jogo eleitoral”: quem participa de uma eleição precisa estar preparado para ser fiscalizado e, se necessário, responder em juízo.

O advogado encerrou destacando o desgaste físico e emocional causado por um processo longo, com sessões sucessivas na capital, mas também a satisfação em ver confirmada, em duas instâncias, a tese jurídica defendida em nome do PL. Ele afirmou esperar que, uma vez diplomado e empossado, Policial Fábio possa exercer o mandato “da melhor forma possível para a coletividade e para a comunidade rondonense”.

 

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