A Reforma Tributária começa a produzir efeitos práticos no agronegócio antes mesmo de sua implementação plena. Em Mato Grosso, sementeiras que adquirem grãos como soja e milho para processamento e comercialização de sementes já trabalham com a perspectiva de tabelas diferenciadas de preços para produtores rurais pessoas físicas e pessoas jurídicas a partir de 2026.
A mudança decorre da nova lógica de tributação prevista na reforma, que altera o momento de incidência dos tributos: em vez de ocorrer ao longo de toda a cadeia produtiva, a cobrança passa a se concentrar no início da produção. Esse novo desenho afeta diretamente a formação de preços e a recuperação de créditos tributários, exigindo ajustes antecipados por parte das empresas do setor.
O alerta surge em um cenário já considerado desafiador para a safra 2025/2026, marcado por elevação dos custos de produção, juros em patamares elevados e incertezas climáticas. Com a reforma, soma-se mais um fator de pressão sobre a rentabilidade do produtor.
Segundo Ieda Queiroz, coordenadora do setor de agronegócios do CSA Advogados, a preocupação é maior porque grande parte dos produtores mato-grossenses ainda atua como pessoa física. A partir de 2026, quem faturar acima de R$ 3,6 milhões por ano estará sujeito às obrigações acessórias típicas de pessoa jurídica junto à Receita Federal.
“A mudança na forma de tributação trará dificuldade e maior morosidade na recuperação de créditos. Esse fator acaba sendo incorporado no valor pago pelas sementes, diferenciando o preço conforme o enquadramento do produtor”, explica.
De acordo com a especialista, produtores que permanecem como pessoa física tendem a enfrentar desvantagens competitivas, justamente pela limitação no aproveitamento de créditos e maior complexidade operacional.
“A migração para pessoa jurídica precisa ser pensada desde já. Além de reduzir impactos tributários, a formalização permite melhor controle de créditos, organização do fluxo de caixa, fortalecimento da governança e até prevenção de problemas sucessórios”, afirma Ieda. “Quem adiar essa decisão pode ficar em clara desvantagem frente aos produtores já estruturados como pessoa jurídica".
O movimento não é apenas teórico. Conforme a coordenadora do CSA Advogados, sementeiras e cooperativas em Mato Grosso já realizam levantamentos internos e estruturam seus sistemas para operar com duas referências de preço, conforme o perfil tributário do fornecedor de grãos.
Esse processo, segundo ela, exigirá também revisão de contratos, ajustes nas formas de negociação e maior embasamento jurídico, justamente para evitar conflitos e quebras contratuais no futuro. “O impacto será inevitável e deve começar a aparecer de forma concreta nos preços praticados já no próximo ano”, conclui.