O metanol, muitas vezes confundido com o etanol por sua semelhança química, esconde riscos devastadores. Pequenas doses - a partir de 10 ml - já podem causar cegueira permanente, e uma intoxicação severa tem potencial de levar à morte em poucas horas. O perigo está na forma como o organismo processa essa substância, cujos efeitos aparecem lentamente e comprometem órgãos vitais.
O médico Alexsandro Wakita, membro da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED), explica: “Enquanto o etanol, presente em bebidas alcoólicas, é convertido em acetaldeído e depois em ácido acético - processo que o fígado consegue, em certa medida, suportar -, o metanol tem destino muito mais agressivo. No corpo, ele se transforma em formaldeído e, em seguida, em ácido fórmico. Esse metabolismo é extremamente lento e favorece o acúmulo em órgãos, sobrecarregando principalmente o sistema nervoso.”
O profissional alerta que um dos primeiros alvos é o nervo óptico, responsável pela visão. Por isso, sintomas como visão turva, manchas, intolerância à luz e até cegueira temporária ou definitiva estão entre os sinais mais característicos da intoxicação.
O perigo do metanol vai além da perda visual. O excesso de ácido fórmico atinge as mitocôndrias, estruturas que produzem energia nas células. “É como encher o pistão de um motor com água: ele para de funcionar. O resultado é uma espécie de asfixia celular, em muitos casos irreversível”, explica o neurocirurgião André Meireles Borba. Quando as mitocôndrias falham, todo o organismo sofre.
Ao contrário do etanol, que provoca desconfortos imediatos, o metanol é traiçoeiro. Os primeiros sinais aparecem, em média, entre 12 e 14 horas após a ingestão, segundo a oftalmologista Hanna Flávia Gomes, do CBV-Hospital de Olhos do Distrito Federal. Entre eles estão dor de cabeça, náuseas, vômitos, dor abdominal, confusão mental e alterações visuais repentinas. Os sintomas não seguem uma ordem específica e tendem a se agravar com o tempo.
“Mesmo que a pessoa tenha ingerido álcool, se horas depois os sintomas persistirem ou piorarem, especialmente os relacionados à visão, deve-se considerar a possibilidade de intoxicação por metanol”, reforça Borba.
Casos suspeitos exigem procura imediata por atendimento médico. O tratamento pode incluir o uso de bicarbonato para corrigir a acidez do sangue, vitaminas como o ácido fólico, antídotos como etanol intravenoso e, em situações graves, hemodiálise. Médicos alertam que não há espaço para soluções caseiras: a intoxicação evolui rapidamente e o acúmulo da substância pode ser fatal.
As unidades de saúde contam com protocolos capazes de identificar rapidamente diferentes tipos de intoxicação e, se necessário, acionar redes de referência para casos complexos. Especialistas destacam que essa agilidade é essencial para reduzir sequelas e salvar vidas.